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11 Junho 2021

Laboral

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DO TRABALHO DE JUSTIÇA DA UNIÃO EUROPEIA (OITAVA SECÇÃO), DE 03 DE JUNHO DE 2021

PROCESSO Zn CONTRA Generalno Konsulstvo na Republika Bulgaria v grad Valensia, Kralstvo Ispania

Reenvio prejudicial (Cfr. artigo 267° TFUE) pelo Sofiyski Rayonen sad (Tribunal Regional de Sófia, Bulgária) – Processo C‑280/20

O Tribunal de Justiça da União Europeia (Oitava Secção) declarou que:

O artigo 5.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2012, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, lido em conjugação com o considerando 3 deste regulamento, deve ser interpretado no sentido de que este se aplica para efeitos da determinação da competência internacional dos tribunais de um Estado‑Membro para conhecerem de um litígio que opõe um trabalhador de um Estado‑Membro que não exerce funções no âmbito do exercício do poder público a uma autoridade consular desse Estado‑Membro situada no território de outro Estado‑Membro.

O artigo 5º, n.º 1, do Regulamento n.° 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2012, consagra que as pessoas domiciliadas num Estado-Membro só podem ser demandadas nos tribunais de outro Estado-Membro nos termos das regras enunciadas nas secções 2 a 7 do presente capítulo. 

Por sua vez o considerando 3 do Regulamento n.° 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2012, prevê que a União atribuiu-se como objetivo manter e desenvolver um espaço de liberdade, de segurança e de justiça, no­ meadamente facilitando o acesso à justiça, em especial através do princípio do reconhecimento mútuo de deci­ sões judiciais e extrajudiciais em matéria civil. A fim de criar gradualmente esse espaço, a União deve adotar me­ didas no domínio da cooperação judiciária em matéria civil que tenham incidência transfronteiriça, nomeada­ mente quando tal seja necessário para o bom funciona­ mento do mercado interno.

Este Acórdão visa pronuncia-se sobre o pedido de decisão prejudicial tendo por objecto a interpretação do artigo 5°, n.° 1, do Regulamento (UE) n.° 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2012, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 2012, L 351, p. 1), lido em conjugação com o considerando 3 deste regulamento.

Aquele pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe ZN ao Generalno konsulstvo na Republika Bulgaria v grad Valensia, Kralstvo Ispania [Consulado Geral da República da Bulgária em Valência (Espanha), a seguir «Consulado Geral»] a respeito de um pedido de pagamento de uma indemnização compensatória por férias anuais remuneradas não gozadas.

ZN alega que, em conformidade com a Lei dos Serviços Diplomáticos, as representações da República da Bulgária só podem empregar pessoas ao abrigo de contratos de trabalho que formalizem a relação entre o empregador e o trabalhador.

A este respeito, especifica que os contratos celebrados satisfazem as exigências relativas ao conteúdo de um contrato de trabalho por força do direito búlgaro.

Por seu turno, o Consulado Geral contesta a competência dos tribunais búlgaros para decidirem o litígio no processo principal e invoca a competência dos tribunais espanhóis, enquanto tribunais do local de trabalho de ZN.

O órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas sobre a existência de uma incidência transfronteiriça, uma vez que o litígio em causa no processo principal diz respeito a um trabalhador búlgaro e a um empregador búlgaro e que a relação jurídica estabelecida entre eles está em estreita correlação com a República da Bulgária.

Além disso, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que a lei búlgara dispõe expressamente que, nos casos de contratos celebrados entre um empregador búlgaro estabelecido no estrangeiro e um cidadão búlgaro que trabalhe no estrangeiro, os eventuais litígios só podem ser examinados pelos tribunais búlgaros. Visto que o Consulado Geral é uma subdivisão de um órgão estatal búlgaro estabelecido noutro Estado‑Membro e que a sua atividade está, em princípio, ligada ao serviço dos nacionais búlgaros, o Regulamento n.° 1215/2012 não se aplica aos litígios que opõem os nacionais de um Estado‑Membro às representações consulares do mesmo Estado‑Membro estabelecidas noutro Estado‑Membro.

Nestas circunstâncias, o Sofiyski Rayonen sad (Tribunal Regional de Sófia, Bulgária) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Deve o artigo 5.°, n.° 1, em conjugação com o terceiro considerando, do [Regulamento n.° 1215/2012], ser interpretado no sentido de que o regulamento é aplicável à determinação da competência internacional dos tribunais de um Estado‑Membro no caso de um litígio entre um trabalhador desse Estado‑Membro e o serviço consular do mesmo Estado‑Membro situado no território de outro Estado‑Membro, ou devem aquelas disposições ser interpretadas no sentido de que a esse litígio são aplicáveis as regras de competência do Estado‑Membro da nacionalidade comum das partes?»

O TJUE salienta a este respeito que no caso de contratos de trabalho celebrados por uma embaixada em nome do Estado, esta constitui um «estabelecimento» na aceção do artigo 18.°, n.° 2, do Regulamento n.° 44/2001, quando as funções dos trabalhadores com os quais celebrou esses contratos estão associadas à atividade de gestão desempenhada pela embaixada no Estado acreditador (Acórdão de 19 de julho de 2012, Mahamdia, C‑154/11, EU:C:2012:491, n.° 52).

Esta conclusão impõe‑se a fortiori quando o contrato de trabalho é celebrado, não por uma embaixada, mas por um consulado geral, desde que estejam reunidas as condições enumeradas no n.° 48 do Acórdão de 19 de julho de 2012, Mahamdia (C‑154/11, EU:C:2012:491).

Segundo aquele Acórdão, por analogia, deve ser considerado que o consulado geral constitui um «estabelecimento» para efeitos do Regulamento n.° 1215/2012, porquanto preenche os critérios enunciados na jurisprudência do Tribunal de Justiça.

Mais concretamente, enquanto estrutura territorial do Ministério dos Negócios Estrangeiros, o consulado geral manifesta‑se duradouramente para o exterior como o prolongamento desse ministério.

O consulado geral representa o Ministério do Estado acreditador; é dirigido pelo cônsul‑geral e está apto a assumir autonomamente direitos e obrigações de direito civil.

Daqui resulta que um consulado pode ser visto como um centro de operações, em conformidade com o que foi considerado nos n.os 49 e 50 do Acórdão de 19 de julho de 2012, Mahamdia (C‑154/11, EU:C:2012:491).

Assim e visto que um consulado constitui um «estabelecimento» de um Estado‑Membro noutro Estado‑Membro, deve considerar-se que uma das partes no litígio tem domicílio ou residência habitual num Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro do tribunal chamado a decidir.

A este respeito o TJUE recorda que os contratos de prestação de serviços em causa no processo principal foram celebrados em Espanha e foi nesse mesmo Estado‑Membro que foram cumpridas as obrigações impostas nesses contratos.

Desse modo e à luz do exposto, foi concluído que o litígio no processo principal tem incidência transfronteiriça.

Por fim o TJUE considerou o seguinte: Uma vez que a questão prejudicial se limita à aplicação do Regulamento n.° 1215/2012 e não versa sobre a determinação da competência dos tribunais búlgaros ou espanhóis no presente caso, caberá ao órgão jurisdicional de reenvio retirar conclusões sobre a aplicação do artigo 362° do Código do Trabalho búlgaro, segundo o qual «[...] Os conflitos laborais entre trabalhadores – nacionais búlgaros que trabalham no estrangeiro – e empregadores búlgaros no estrangeiro são submetidos ao tribunal competente de Sófia, ao passo que, quando o trabalhador é o requerido, [os referidos conflitos são submetidos] ao tribunal competente do lugar de residência do trabalhador no país.»

O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) interpreta o direito europeu para garantir que este é aplicado da mesma forma em todos os países da UE e delibera sobre diferendos jurídicos entre governos nacionais e instituições europeias.

 

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